terça-feira, 5 de março de 2013

"Inquisição de Évora. Dos primórdios a 1668", de António Borges Coelho

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A Inquisição de Évora é, neste livro em dois volumes de António Borges Coelho, vista sobre a perspetiva das suas vítimas. O autor utiliza uma linguagem simples, direta e, por vezes, algo literária. Julgo que estes dois aspetos conferem a esta obra um certo perfil popular, o que, na minha perspetiva, nem sempre convém a um texto de tipo académico (trata-se da tese de doutoramento que o autor apresentou à Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa).
Para a construção deste estudo, que terá implicado dez anos de pesquisa, o autor serviu-se de um volumoso manancial documental (sobretudo os processos inquisitoriais), esforço que aliás transparece tanto ao longo do texto, como nas cerca de 180 páginas do apêndice documental. Faz-se de modo constante "falar" a documentação, ainda que, a meu ver, nem sempre fazendo (no texto escrito, entenda-se), de forma profunda, a crítica das fontes. Por vezes, o autor assume literalmente o conteúdo dos documentos e/ou obras citadas, o que é visível na sua tendência de fazer longas citações (no capítulo "Repressão ideológica e sexual", por exemplo, esse abuso da transcrição constante de casos exemplares torna-se algo monótono); por outro lado, nem sempre se faz a necessária desconstrução e síntese do que é analisado.
Um aspeto que ressalta à vista, para quem acompanha o que se vai publicando no campo da História, é pobreza ao nível da quantificação: as longas tabelas ou arrolamentos (o autor chama-lhe "mapas") que são, de quando em quando, inseridos no texto, nem sempre permitem uma leitura inteligente - os dados poderiam, por exemplo, ter sido trabalhados de forma a se obterem uns quantos gráficos mais significativos.
Por último, parece-me que o autor nem sempre se livra de fazer juízos de valor, até mesmo juízos morais - o que só serve para condicionar a interpretação de quem lê. A comparação entre o aprisionamento inquisitorial do período moderno português e a repressão política no período pré-1974 parece-me escusada (ainda que tendo em conta o percurso do autor, que, pela sua ação política, esteve preso).
De qualquer forma, ainda que outras obras existam sobre o tema (refiro-me à atuação da Inquisição em Portugal), trata-se de um trabalho de interesse.

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